Pergunto das crianças na rua Olho para os carros Pergunto dos mendigos na calcada Vejo os saltos que pisam tilintando futilidades ao passar Pergunto da fome Vejo os lixos entupidos de enlatados apodrecidos pelo excesso Pergunto pelas escolas Olho para gente falando a ninguém em frente ao quadro verde pastiche da vida E ainda tento encontrar educação Para a saúde Gente de branco tentando esconder humanidade e em frente gente sofrendo pedindo informação e atenção então Olho para a TV E vejo as crianças emudecidas e os adultos crianças torpes Olho para a janela e vejo a montanha ao longe atrás dela nada nada nada Em que acreditar A não ser em ser algo que não seja isso tudo. Quando morrer quero deixar a flor
domingo, 27 de maio de 2007
POÊ
sexta-feira, 2 de março de 2007
De todo humana
Dê-me a permissão para servir-te. Sei que é tua própria casa. Por isso mesmo dê-me a permissão para que fiques à espera no sofá azul que te merece inteira. Não levantes. Servir-te. À tua beleza ali posta sob a medida inexata do tecido perfumado.
Deixe-me servir-te. Celebrar em casa o que ao olhar foi. Fica uma certeza. E como em qualquer oposto que somos, o oposto disso também. Certeza de que ali encontrou-se o que foi. E no oposto do que a certeza encerra, sobrevive alegria regenerada, engendrando uma mistura de divindade humana.
Imagem
terça-feira, 27 de fevereiro de 2007
Tatuagem
Tenho tantas. Outras. Tenho? Quero ser. Vejo a menina, vejo a mulher. Tenho tatuagem, sabia? Mas não me espete. Fique de longe, sou voraz. Posso ir. Pulando. Quero caminhar, caio. Pulando porque tenho a menina, pulando a corda. Segura aí, vai, não solta pra me ajudar! Preciso de dois, de um lado e do outro lado, lá. Onde ? Não sei. Lembro do mar, como gostava do mar... As montanhas me cercam. Em passos largos que voltam ao não centro percorro várias. Não extremidades não círculos passo paro pulando. Segura aí! Onde pulsa o lugar, aquele que te falei. Tantas vezes.
Faço velhinhas muito simpáticas, com o pano na mão venho tecendo a vida inteira. Assento-as sobre a prateleira, respeitáveis, guardam segredos nos novelos de lã secretos. Resguardo o tempo encontrando o tempo, na mão silenciosa, me resguardo no ato. Da corda que pulei no ritmo infantil vou ao encontro do tecido simples para me lembrar. Do futuro. Que passou. Quantos futuros poderia costurar na chita descompassada da memória? Costuro enfio o fio na agulha fina. Que desafia o buraco um lado de lá que vira boneca. Assento-a junto às amigas, precisam conversar. O sofá está cheio, a casa tem estragos que não tive como reparar. Encontro o lugar da exposição para as bonecas que conversam aparentes amenidades.
Chega de gritaria! Vou gritar como nunca que o silêncio me estarrece de alegria. Não há modelo nem ficção suficientes. Como disse tenho uma tatuagem colocada no seio. Sob a roupa que procura o estilo, se preciso pular é porque inquieta sou. Menina, não suba no ar, você vai cair! Não, mãe, sei pular. Alto. Só preciso de uma corda pra bater o ritmo e de dois que segurem a corda. Vou cortar o ar para quebrar de uma vez por todas o tempo.
Lampejo
Rapaz
Passagem
Reservo a ele: Rapaz
Guardarei tal qual flor no seio úmido do tempo
Broto do bambu fértil
Olho do mar aberto
A barca navegante
Perdição em água movente
Por sobre sua sobrancelha grossa marrom
A ranger as rugas do meu passatempo alegre, predileto
Enxergarei assim Rapaz
à sua própria imagem
Palavra desvio semelhança
Subterfúgios-oceanos verdes-azuis
Aparentes, infinitos
Meus eus amam por ti
Agora com as alegrias
Amarelas
As conquistas
Vermelhas
As rupturas
Brancas
Os encontros mar
Transparências azuis
Peixes alados incham-se na chuva
quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007
Instante
O ambiente era num clube. Havia uma moça, de idade próxima aos 20, sentada em frente ao pai que lia, imutável, o seu jornal. Ela de óculos escuros inquietamente mexia o pescoço ao alcance do que interessasse. Viu o bebê ao longe e sorriu. A criança compreendeu o chamado e sorriu. A moça a procurava. O pai estava alheio a isso.
O clima era cinza, mormaço, ela de roupa o observava disfarçando o pedido. Quase não se mexia. Havia um perigo aterrorizante em se mostrar. Não era entendida nos braços finos, pouco de si exposto no tempo, um lugar conhecidamente seu.
A criança festejava o encontro com os óculos negros fundos da mocinha magra, que parecia uma leitora do mundo. Gostou do seu sorriso direcionado de longe, aberto à distância imprecisa. A moça fazia contato com sua beleza pueril. A memória expandia-se no céu nublado. Barulho pequeno de xícaras servidas na mesa do jantar delirava a lembrança muda.
O pai se levantou. Ela o seguiu, posicionando-se com a bolsa intermediária. A criança pediu atenção. Ela passou. O pai sorriu para a criança e nesse instante a moça já tinha ido embora de tudo ali.